O coelho da Páscoa, que traz os ovos de chocolate, Ă© um dos grandes sĂmbolos da Páscoa moderna, e sua origem, enquanto sĂmbolo pascal, Ă© explicada por diferentes teorias.
O coelho da Páscoa Ă© aquele que, na tradição, traz os ovos de chocolate, Ă© um dos grandes sĂmbolos da Páscoa moderna.
A Páscoa, como todos sabemos, relembra a prisĂŁo, crucificação e morte de Jesus Cristo e celebra a sua ressurreição. A Páscoa tambĂ©m tem, como grandes sĂmbolos, o ovo de chocolate e o coelho da Páscoa. A associação que existe entre ovo, coelho e Páscoa Ă© estranha para muitos, afinal, o que tem a ver o coelho com uma festa cristĂŁ? Nesse texto, vamos procurar esclarecer algumas coisas referentes Ă histĂłria do coelho da Páscoa.
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História do coelho da Páscoa
Na tradição consolidada atualmente, sobretudo nos paĂses do HemisfĂ©rio Norte, o coelho da Páscoa Ă© aquele quem traz os ovos de chocolate e os esconde para que as crianças possam procurá-los. Assim, Ă© comum que, durante a Páscoa, os pais escondam os ovos de Páscoa para que as suas crianças procurem por eles.
Existem muitas teorias a respeito da origem do coelho da Páscoa, algumas afirmam que a associação do coelho com a Páscoa tem origens pagĂŁs, enquanto outras teorias sustentam que o coelho, desde a Idade MĂ©dia, já possuĂa uma relação direta com o Cristianismo. De fato, neste momento, Ă© impossĂvel sustentar qual das duas teorias Ă© a correta, mas, de toda forma, elas nos fornecem elementos para pensarmos sobre o assunto.
Primeiramente, a consolidação do coelho como sĂmbolo da Páscoa (e da maneira como comemoramos essa festa) aconteceu por volta do sĂ©culo XIX e está diretamente relacionada com a transformação da forma como o mundo ocidental enxergava as crianças. A partir do sĂ©culo XVII, tal forma transformou-se radicalmente, e a infância começou a ser vista como um momento preparatĂłrio para a vida adulta.
Essa transformação no modo como a infância era entendida contribuiu para o costume de comemoração de feriados, como a Páscoa. Essas festas transformaram-se em celebrações mais caseiras e voltadas para o âmbito familiar. Nesse sentido, os ovos de Páscoa e o coelho da Páscoa foram sĂmbolos importantes que consolidaram a Páscoa como um feriado domĂ©stico.
A prática de decorar o ovo de Páscoa e sua associação com a Páscoa cristĂŁ tĂŞm origens diversas, como podemos ver neste texto. A decoração de ovos era uma prática realizada por persas durante uma comemoração no equinĂłcio de primavera (prĂłximo Ă data que comemoramos a Páscoa), e a importância do ovo enquanto sĂmbolo de renascimento esteve presente na cultura chinesa, por exemplo.
Na cultura pagã europeia, o ovo esteve associado a uma deusa da mitologia germânica, e a decoração de ovos era uma prática realizada por povos eslavos na região da atual Ucrânia. Existem histórias do Cristianismo Ortodoxo que relacionam os ovos à Maria Madalena, e o ato de pintar ovos de vermelho, nas regiões do Cristianismo Ortodoxo, era comum.
Mas e o coelho? Quando o coelho passou a ser associado com ovos e por que se tornou um sĂmbolo da Páscoa? A respeito das mĂşltiplas possĂveis origens do coelho da Páscoa, nĂłs temos teorias que o associam com o Cristianismo e com o paganismo. Vejamos as duas:
Paganismo
Paganismo
As teorias mais levantadas, e que geralmente são as mais consideradas, são aquelas que associam o coelho da Páscoa ao paganismo. A teoria mais conhecida é aquela que relaciona o coelho de Páscoa com uma deusa da mitologia germânica (presente também na mitologia nórdica e na anglo-saxã) chamada de Ostara ou Eostre.
Essa deusa era conhecida por ser uma deusa da fertilidade, e muitos acreditam que ela tem relação direta com o nome da Páscoa no HemisfĂ©rio Norte — Easter, em InglĂŞs, e Ostern, em AlemĂŁo. A relação de Ostara com o coelho da Páscoa (no AlemĂŁo, inclusive, coelho da Páscoa Ă© osterhase, o que reforça essa aproximação com Ostara), segundo essa teoria, remonta a uma histĂłria em que a deusa Ostara transforma um pássaro em coelho para divertir algumas crianças.
Representação moderna de Ostara, deusa da fertilidade na mitologia germânica.
O pássaro (transformado em coelho) não estava feliz com a transformação e desejou voltar à sua forma original. Depois que isso aconteceu, como forma de agradecimento, o pássaro deixou alguns ovos coloridos para a deusa, que, então, os deu de presente para as crianças. Essa teoria fez com que Ostara fosse popularizada como a origem da associação dos ovos coloridos com o coelho e a Páscoa.
Tal vĂnculo do coelho com a Páscoa, pela via da deusa, na cultura do HemisfĂ©rio Norte (Alemanha e Estados Unidos, principalmente), tem como referĂŞncia tambĂ©m uma citação de Jacob Grimm, que, em um livro sobre a mitologia germânica, publicado no sĂ©culo XIX, afirmou sua existĂŞncia.
A relação da Páscoa cristã com a deusa Ostara também foi encontrada em uma citação de Beda (também conhecido como Venerável Beda), padre do século VIII. Apesar disso, não existe embasamento histórico que sustente o argumento recém-apresentado. Inclusive, é importante pontuar que o consenso existente é o de que a Páscoa é uma festa cristã, originária de uma festa de origem hebraica (a Pessach).
Cristianismo
Selo santomense da pintura de Tiziano Vecellio que retrata a Virgem Maria com o coelho branco.*
Algumas teorias tambĂ©m apontam que o coelho da Páscoa pode ter surgido do Cristianismo, conforme pontuaremos nesta parte. Primeiramente, deve ser mencionado que as possĂveis origens cristĂŁs do coelho da Páscoa tĂŞm associação inicial com a lebre. Com o passar do tempo, a figura da lebre foi sendo substituĂda pela do coelho, um animal mais dĂłcil e que se encaixava nas tentativas de tornar a Páscoa uma comemoração mais domĂ©stica, conforme mencionamos no começo deste texto.
Em inúmeras construções de iconografia cristã, a lebre (ou o coelho) aparecia, e, aparentemente, na mentalidade cristã da Idade Média, existia uma relação (muito estranha para nós) da lebre com a virgindade. Isso fazia com que o animal aparecesse junto à Virgem Maria, e a origem dessa colocação pode ocorrer pelo fato de que muitos acreditavam que a lebre era um animal que se reproduzia assexuadamente.
Essa colocação das lebres (e coelhos) ao lado da Virgem Maria resultou atĂ© em uma obra de arte conhecida como “A Virgem com o coelho”. Essa pintura foi produzida por Tiziano Vecellio e mostra a Virgem Maria segurando um coelho branco, o qual era enxergado como um sĂmbolo de pureza.
AlĂ©m disso, existe uma gama de outros objetos da iconografia cristĂŁ em que há a presença de coelhos e lebres, como os encontrados em Devon, na Inglaterra. Nas igrejas medievais dessa cidade inglesa, existem uma sĂ©rie de cruzes que possuem um cĂrculo com trĂŞs lebres (ou coelhos) interligados pela orelha. As teorias que explicam esse cĂrculo de lebres sĂŁo as duas seguintes:
As lebres (ou coelhos) eram entendidas como um sĂmbolo de castidade, pela crença existente de que elas conseguiam reproduzir-se sem perder a virgindade.
Esses animais eram representados como um sĂmbolo da Trindade, importante conceito do Cristianismo.
Inclusive, os historiadores identificaram um padrĂŁo no qual, em diversos locais, o cĂrculo com as trĂŞs lebres era colocado prĂłximo a sĂmbolos pagĂŁos, o que sugere uma substituição de um Ăcone pagĂŁo por um Ăcone cristĂŁo.
Representação moderna do cĂrculo de trĂŞs lebres.
Outra relação do coelho com o Cristianismo sugere como, em muitos locais do HemisfĂ©rio Norte, o coelho passou a ser visto como um sĂmbolo cristĂŁo. Isso porque, durante a Ă©poca em que a Páscoa era comemorada (prĂłxima ao EquinĂłcio de Primavera), o coelho era um dos primeiros animais a serem vistos com o fim do inverno. Isso fez com que o animal passasse a ser enxergado como um sĂmbolo da renovação e, portanto, da ressurreição.
Por fim, uma outra teoria sugere que a associação do coelho com a Páscoa foi obra dos protestantes, que afirmavam, para as crianças, que os ovos acumulados (resultado da Quaresma) eram trazidos pelos coelhos, sob a Ăłtica que esses eram sĂmbolos de fertilidade.
Quando a história do coelho da Páscoa foi consolidada?
A primeira menção a um coelho trazendo os ovos de Páscoa remonta a um texto germânico de 1572. Existe outra menção ao coelho da Páscoa, em outro texto germânico, só que esse texto é do século XVII. Inclusive, é no século XVII que os especialistas sugerem que a história do coelho da Páscoa, como aquele que trazia os ovos decorados para as crianças boas, consolidou-se.
A tradição de associar o coelho com os ovos de Páscoa foi levada, da regiĂŁo da atual Alemanha para os Estados Unidos, por imigrantes que se estabeleceram na regiĂŁo da Pensilvânia, por volta do sĂ©culo XVIII. A histĂłria popularizou-se e transformou-se em um dos grandes sĂmbolos da Páscoa moderna. Nos Estados Unidos, o coelho da Páscoa tornou-se popular somente durante a Guerra Civil, travada no sĂ©culo XIX.
Os ovos de chocolate sĂł surgiram no sĂ©culo XVIII, por meio de confeiteiros franceses, e, com o tempo, os ovos de galinha decorados que eram trazidos pelos coelhos foram sendo substituĂdos pelos ovos de chocolate.
*Créditos da imagem: Svic e Shutterstock
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